sexta-feira, 3 de junho de 2011

VIVER NÃO DÓI (Carlos Drummond de Andrade)


Definitivo, como tudo o que é simples.
Nossa dor não advém das coisas vividas,
mas das coisas que foram sonhadas
e não se cumpriram.
Por que sofremos
tanto por amor?
O certo seria a gente não sofrer,
apenas agradecer por termos conhecido uma pessoa tão bacana, que gerou em nós
um sentimento intenso
e que nos fez companhia por um tempo razoável,
um tempo feliz.
Sofremos por quê?
Porque automaticamente esquecemos
o que foi desfrutado e passamos a sofrer pelas nossas projecções irrealizadas, por todas as cidades que gostaríamos
de ter conhecido ao lado do nosso amor e não
conhecemos, por todos os filhos que gostaríamos de ter tido
juntos e não tivemos, por todos os shows e livros e silêncios
que gostaríamos de ter compartilhado, e não compartilhamos
Por todos os beijos cancelados,
pela eternidade.
Sofremos, não porque
nosso trabalho é desgastante e paga pouco,
mas por todas as horas livres
que deixamos de ter para ir ao cinema,
para conversar com um amigo,
para nadar, para namorar.
Sofremos, não porque nossa mãe
é impaciente conosco,
mas por todos os momentos em que
poderíamos estar confidenciando a ela
nossas mais profundas angústias
se ela estivesse interessada
em nos compreender.
Sofremos, não porque nosso time perdeu,
mas pela euforia sufocada.
Sofremos não porque envelhecemos,
mas porque o futuro está sendo
confiscado de nós,
impedindo assim que mil aventuras
nos aconteçam,
todas aquelas com as quais sonhamos e
nunca chegamos a experimentar
Como aliviar a dor do que não foi vivido?
A resposta é simples como um verso:
Se iludindo menos e vivendo mais!!!
A cada dia que vivo,
mais me convenço de que o
desperdício da vida
está no amor que não damos,
nas forças que não usamos,
na prudência egoísta que nada arrisca,
e que, esquivando-se do sofrimento,
faz perder também a felicidade.
A dor é inevitável.
O sofrimento é opcional.

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